Considerado um dos maiores filósofos e escritores espanhois, José Ortega Y Gasset (1883-1955) foi também teórico social, ensaísta, crítico cultural, educador, editor de jornal e a até mesmo político. Em 1931, foi eleito deputado da República, onde só conseguiu atuar por um período muito breve, até se desiludir completamente do espetáculo das tribunas, aos mesmos moldes de Platão.
Uma das maiores dores do filósofo, a qual se refletiu em quase todo seu trabalho, era a visível decadência da filosofia perante a revolução científica que perdurou nos últimos dois séculos, e que acabou por transformá-la em nada mais que um sinônimo de teoria do conhecimento (intitulando-se assim a maioria dos livros de filosofia publicados na sua geração). Sua grande missão como filósofo era, portanto, resgatar o significado da filosofia do cativeiro cientificista em que havia sido posto em nome da evolução e do progresso.
"Veremos concretamente, depois de os filósofos terem sofrido com rubor o desdém dos homens de ciência, como esse insulto hoje nos agrada – pelo menos a mim – e, pegando-o no ar, o devolvemos dizendo: a filosofia não é uma ciência, porque é muito mais."
A visão até então dominante de que não há outro conhecimento do mundo "stricto sensu" além do conhecimento científico, de que não há mais verdade sobre o real além da "verdade científica" (ou "física"), era inaceitável ao escritor espanhol. Para ele, a ciência possui qualidades admiráveis, principalmente a de ser regida por um duplo critério de certeza: a dedução racional e a confirmação pelos sentidos. Mas essas qualidades, mesmo que admiráveis, não bastam para assegurar que não haja um conhecimento mais perfeito do mundo, um "tipo de verdade" superior à verdade científica.
Para afirmar isso, seria necessário desenvolver, em toda sua amplitude, a pergunta: o que seria aquilo que chamamos de conhecimento exemplar, protótipo de verdade, se tomássemos precisamente o sentido que a palavra "conhecer" tem em si? Só quando soubermos o que é conhecimento, em sua significação plena, podemos ver se aqueles que o homem possui têm ou não essa significação ou se meramente se aproximam dela.
Pode-se dizer, assim, que a grande questão à qual a filosofia "ortegana" se dedica é a questão do conhecimento.
"Enquanto não se tiver isso, não se pode falar a sério de teoria do conhecimento, e, com efeito, como a filosofia dos últimos tempos tem pretendido ser somente isso, acaba que não foi nem isso."
Na mesma linha, impõe-se com vigor à filosofia de Ortega y Gasset o problema da historicidade. Para o autor, cada época, cada geração parte de supostos mais ou menos distintos; isso quer dizer que o sistema das verdades e dos valores estéticos, morais, políticos e religiosos tem inexoravelmente uma dimensão histórica – são relativos a certa cronologia vital humana, valem para certos homens e nada mais.
Por isso, em todas as ordens, tanto em ciência como em moral, política ou arte, muitas vezes falhamos em entender uma ideia ou uma obra: falta-nos a palavra do enigma, a chave da convenção secreta. A verdade é histórica. E como, não obstante, ela pode e tem de pretender ser supra-histórica, sem relatividades, absoluta, constitui "o tema do nosso tempo".
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