Os Elementos da Aprendizagem

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Por Maurizio Casalaspro
05 de junho de 2022

Quando decidimos aprender algo novo ou simplesmente evoluir nos estudos, é muito comum nos perguntarmos qual a melhor maneira de se fazer isso. Uma vez decidido o destino final, precisamos definir e planejar o caminho. Também é preciso ter algum conhecimento sobre os obstáculos que surgem e compreender as próprias limitações.

Ao refletir brevemente sobre como alguém de sucesso chegou lá, a resposta mais comum e imediata é simplesmente achar que se torna melhor quem estuda mais, e os melhores só são os melhores porque se dedicaram mais. Ou seja, basta deixar a preguiça de lado e aumentar a dedicação. Alguns preferem atribuir a causa ao talento, dizendo que Mozart era muito talentoso, menosprezando o esforço. No fundo, todos reconhecem a importância do esforço e do estudo.

Mas será que é apenas isso? Os melhores estudam mais? Um grande músico só está lá por ter estudado mais? Um atleta só chegou às olimpíadas por ter praticado mais? Só passam no vestibular os alunos que ficaram mais horas debruçados em livros? É comum ouvir sobre o número mágico das 10 mil horas — adquire-se a maestria depois desse tanto de prática. Alguns falam das 20 mil horas. Então, basta estudar esse tanto em alguns anos e pronto, certo?

Acreditar apenas nisso é deixar de lado uma série de considerações sobre o próprio funcionamento da mente e do corpo. É importante termos mais detalhes sobre o que acontece nessas supostas 10 mil horas de dedicação.

Um corredor que exagera em seus treinos possui grandes chances de se lesionar, assim como uma longa sessão de estudos na véspera da prova pode ter efeitos negativos a longo prazo. Da mesma forma que o corpo precisa de um determinado estímulo de treino para ficar mais forte, o cérebro tem uma dose certa de informações para registrar e conseguir guardá-las na memória.

Fiz uma lista (não exaustiva, claro) de alguns pontos que descobri ao longo do tempo e deixo, no final, algumas referências para quem quiser buscar mais informações ou para quem simplesmente não acredita em mim.

Algumas obras foram escritas repletas de conselhos para estudantes. Pe. Sertillanges em “A Vida intelectual”, Pe. Narciso Irala, autor de “Eficiência sem fadiga” e “Controle cerebral e emocional”, Jean Guitton em “O trabalho intelectual”, Emílio Mira Y López em “Como estudar e como aprender”, dentre outros, são livros importantíssimos e obrigatórios a quem se interessa por esse tema. Outros vou citando ao longo do texto.

Identifique o tema de verdadeiro interesse

O interesse é o elemento mais básico em qualquer aprendizagem. Só aprendemos bem aquilo que nos interessa. Claro que também é possível aprender algo que não temos interesse algum, mas é pouco provável que seja possível atingir um nível mais alto de conhecimento de algo que realmente não nos cativa.

Uma forma fácil de identificar o verdadeiro interesse é relembrar o que costumamos fazer sem sentir cansaço ou enfado. É algo que desperta entusiasmo e vontade de aprender e melhorar. Essa sensação de engajamento até nos faz perder o sono. Não sentimos as horas passarem. Apesar do esforço intenso, sentimos prazer na atividade. O foco e a atenção surge de forma fácil e rápida e terminamos a atividade melhores do que quando a começamos.

É comum observar escolas ignorando essa simples regra do aprendizado. Na verdade, o maior desafio de um educador é justamente despertar o interesse e simplesmente guiar e orientar a partir disso. Uma vez interessado no assunto, as crianças aprendem numa velocidade inacreditável. Essa diferença é comparável ao rendimento de alguém empurrando um carro desligado, enquanto outro encontra uma forma de ligar o veículo e o vê indo longe sozinho, apenas precisando de algumas direções. Não é preciso insistir. Não é preciso chantagear, punir ou oferecer recompensas. Enfim, não é necessário manipular uma criança a aprender algo que ela naturalmente faria por prazer.

Infelizmente, o mais comum é cometer essa falha. Na tentativa de acelerar o aprendizado de uma criança com técnicas da psicologia comportamental, o resultado é o inverso. Observamos um resultado fantástico a curto prazo, mas um grande problema surge no longo prazo. Tiramos o prazer de uma criança aprender quando exercemos controle sobre o resultado da atividade ou sobre o esforço da criança. Quando elogiamos uma atividade com o objetivo de controlar o comportamento dela, transferimos todo o prazer que ela teve na tarefa para o simples agrado aos pais.

O natural é que se tenha interesses diversos em inúmeros assuntos. As crianças são assim. Se maravilham com tudo ao redor. Com o passar do tempo, isso se reduz. Os interesses vão se estreitando e as técnicas de psicologia comportamental aplicadas em sala de aula e até mesmo pelos pais (muitas vezes sem saberem), acabam minando essa vontade de aprender. Se você já é adulto e não se sente interessado por muita coisa, é bem possível que não tenha se dado muito bem com o sistema escolar ou com a cobrança por boas notas em casa. (link para meu artigo “Como treinar seu filho para ser bem-sucedido” no final do texto).

Verifique se a motivação é adequada e duradoura.

A motivação não é menos importante que o interesse. Até podemos manifestar interesse em algo, mas se houver a motivação errada, o limite de onde se pode chegar será muito reduzido.

Será mesmo que a criança está interessada mesmo a ter aulas de Ballet, ou era um sonho de infância de seus pais? Será que a motivação é da própria criança?

Ao almejar ser especialista em algo, será que não se busca apenas o reconhecimento social? Buscar apenas fama ou dinheiro pode dar grande sensação de energia e motivação no começo, mas é pouco provável que isso se mantenha assim nas horas de tédio nas longas sessões de estudo ou quando as coisas ficarem mais difíceis, ou simplesmente quando o caminho parecer longo demais.

Se a motivação é fraca, ficamos ansiosos pelo resultado.

Claro que desejar reconhecimento não é um problema em si, mas é fácil perceber nas biografias de grandes personalidades que sempre houve algo além disso.

Robert Greene identifica a importância de valorizar mais o aprendizado que o dinheiro como uma das bases do aprendizado. Se o motivador for fraco, é esperado que se tenha problemas também nos outros itens listados pelo autor, impactando a perseverança e capacidade de aprender com os próprios erros. O método de tentativa e erro parece arriscadíssimo para um adulto que está querendo sempre ganhar dinheiro, mas parece não incomodar as crianças que estão explorando alguma atividade nova, sem ter em vista o resultado econômico.

Planeje-se e mapeie o trajeto

Uma vez identificado algo em que se tenha real interesse, e verificado se as motivações não farão dissipar suas energias a longo prazo, é preciso determinar e planejar estratégias para atingir os objetivos.

Ainda no livro Mastery, Robert Greene, o autor detalha exatamente o que é necessário em um aprendiz para que um dia se torne mestre.

Não estou falando aqui em diplomas ou certificações, mas da maestria em si. Quando um músico faz uma apresentação lamentável, por exemplo, não apreciamos aquilo só pelo fato do músico ser diplomado. Também não aceitamos erros médicos quando vemos o carimbo com o número do CRM.

Se tornar um verdadeiro mestre em seu próprio ofício tem muito mais a ver com a própria vocação do que com a obtenção de diplomas. Mas, mesmo os grandes mestres um dia foram aprendizes. Não se deve atribuir tudo simplesmente ao talento, pois isso é apenas parte da composição final.

Robert Greene separa a fase do aprendiz em três grandes etapas:

1º — O modo de profunda observação: o modo passivo, onde não é preciso se manifestar de forma alguma, apenas observar as regras, as relações de poder e ter pleno conhecimento do entorno;

2º — Em seguida, começa a prática e a obtenção das habilidades. A aceitação do tédio e da resistência mental de se manter na zona de conforto, a fixação mental de habilidades e o número mágico das 10 mil horas de estudo; e, por fim,

3º — Modo ativo: a obtenção da experiência e a superação das incertezas e inseguranças.

Em seguida, em sua obra, detalha algumas estratégias para se tornar o aprendiz ideal: valorizar mais o aprendizado que o dinheiro, ampliar seus conhecimentos, restabeleça o sentimento de inferioridade, confie no processo, aumenta sua resistência e supere a dor, aprenda com o fracasso, combine o “como” com o “o quê”, e avance pelo método de tentativa e erro.

Se as etapas descritas acima despertou seu interesse, é realmente recomendado que compre um exemplar do livro e leia. É um excelente livro.

Entendi. Então, já posso começar a contar as 10 mil horas de prática?

Simplesmente falar sobre esse número mágico de dez mil horas e achar que basta praticar esse tanto para chegar lá é uma simplificação cheia de problemas.

Isso significaria que se dedicar por 12 horas diárias por dois anos para se tornar um verdadeiro mestre em algo? Claro que não. Como falamos acima, o corpo possui uma série de necessidades além de comer e dormir. A necessidade de repouso é fundamental. É preciso saber se alimentar adequadamente e saber identificar a hora certa para deixar os estudos de lado por algum tempo. Devemos conhecer os próprios limites e também adequar-se aos imprevistos que sempre surgem.

É necessário encontrar um equilíbrio nisso tudo constantemente.

Já foi verificado que estudar nas vésperas de provas pode fazer você ter bom desempenho nela, mas provavelmente não se lembrará de muita coisa no ano que vem e de praticamente nada anos depois. No entender de alguns educadores, esse fato até coloca em xeque todo o sistema de ensino que é praticado hoje. Na avaliação de Bryan Caplan, a escola desenhada como é hoje apenas treina as pessoas a obterem diplomas e aprenderem a emitir sinais de competência para os futuros empregadores, ao invés de transmitir conhecimentos e ensinar habilidades, como dizem fazer. O mesmo tema é analisado por autores como Susan Bauer, John Holt, Anthony Esolen, John Taylor Gatto, Charlotte Thomson Iserbyt e muitos outros.

Para quem realmente deseja reter por muito tempo o aprendizado, Prof. Pierluigi recomenda que se revise o conteúdo visto de manhã na parte da tarde, e isso se mostra correto pelo que se sabe de neurociência. Recomenda, inclusive, que se estude apenas um pouco por dia, ao invés de acumular conteúdo e estudar tudo em um só dia.

Assim que começamos a dormir, o cérebro realiza uma filtragem de tudo que aconteceu durante o dia e faz um processo de filtragem e seleção. É como se cada evento do dia ficasse em uma ficha e no fim do dia o arquivista vai selecionar aonde vai cada ficha. Se um evento do dia é considerado importante, fica em um lugar de fácil acesso. Se for uma informação que parece ter pouca relevância, vai ficar esquecida em algum arquivo longe e de difícil acesso.

Se uma determinada ficha precisa ser acessada no dia seguinte e nos próximos, é um sinal para que o arquivista deixe a informação mais disponível no futuro. A repetição é tão importante quanto o foco e atenção plena.

O cérebro também é preparado para arquivar certas informações prioritárias. Um evento traumático, por exemplo, com muito envolvimento emocional, costuma ser registrado no cérebro em um lugar especial e de imediato acesso posterior. Animais também fazem o mesmo, criam medos e reações imediatas a determinados estímulos. Isso pode garantir a sobrevivência da espécie e nos faz evitar certos riscos de maneira automática.

Essas memórias traumáticas raramente são apagadas. Ficam presentes mesmo quando as outras memórias falham. Pessoas com Alzheimer podem esquecer quem são as pessoas ao seu redor, mas ainda lembram dos piores momentos de suas vidas. Não porque são rancorosos, mas porque é uma das poucas memórias que lhe restam. O mesmo acontece quando estamos exaustos, as preocupações vêm à tona e parecem não saírem mais da cabeça. Quem sofre de depressão entende bem dessa sensação. Pior é que, quanto mais se pensa a respeito, mais ainda aquela memória é reforçada.

Voltando aos estudos, sabemos então que eles devem ser feitos de tal forma que o cérebro entenda que aquilo é importante e deve ser bem gravado. Os neurônios utilizados na tarefa serão reforçados e aquela habilidade e aquelas informações serão melhoradas a cada dia. Habilidades motoras finas e conhecimentos mais técnicos não são guardados na memória da mesma forma que os traumas são arquivados. As regiões do cérebro são distintas e o resultado é totalmente diferente.

Esse processo de arquivamento ocorre apenas durante o repouso. Da mesma forma que os músculos treinados na academia só se fortalecem durante o repouso, o cérebro precisa de repouso para fazer um processo similar.

Alguns enxadristas com quem conversei costumam ver pecinhas se movendo rapidamente ao fechar os olhos para dormir depois de um dia de muito estudo. Sensações similares costumam aparecer depois de um dia de muito esforço mental. Em geral, no entanto, essa agitação mental não ocorre de forma consciente e podemos dormir em paz. Isso nada mais é que o cérebro repassando tudo e vendo a melhor forma de lidar com aquele monte de informação processada durante o dia. É um processo natural e muito importante. Significa que tudo está sendo revisto e o cérebro está procurando padrões para arquivar tudo da melhor forma.

Essa habilidade de identificar padrões é tão impressionante e faz parte de um processo de simplificação que é utilizado para inúmeras funções. Conforme suas habilidades em algo vão melhorando, não é necessário prestar atenção em tudo. Boa parte da informação é processada e calculada, mas de forma tão rápida que parece automática e instantânea. Isso permite que façamos coisas extremamente complexas com aparente facilidade.

O cérebro possui inúmeras capacidades de simplificação. Isso é importante para tornar nossa vida funcional. Não seria possível perceber absolutamente tudo a nível consciente. Apenas uma pequena parte do que o cérebro calcula e processa é percebido conscientemente.

Por exemplo, nossa orelha possui curvas e contornos que produzem uma série de micro ecos, captados pelo tímpano. É como se um único som chegasse diversas vezes com intervalos mínimos entre eles. No entanto, não ouvimos tudo isso. Não ouvimos uma profusão de sons descoordenados quando ouvimos uma melodia. O cérebro simplifica o som antes que se torne consciente, e assim, podemos apreciar e compreender. Esse mecanismo extremamente complexo serve para nos dizer de qual direção o som vêm. O lóbulo, por exemplo, ajuda a identificar se o som vem de trás ou pela frente.

Então, se mesmo estudando bastante você não está retendo muita informação, é possível que esteja cometendo algum erro no processo de estudo ou talvez seu corpo esteja precisando de algo mais para funcionar melhor. Algo deve estar fora dos eixos. Da mesma forma que existem exercícios físicos específicos para certo objetivo, existem diferentes formas de se estudar algo para desenvolver alguma habilidade mental específica.

Se você tem certeza que o está genuinamente interessado no assunto e possui a motivação adequada, é bom considerar também os outros aspectos.

Ajustar as sessões de estudo à capacidade de manter o foco

Lembra que disse acima que apenas as informações consideradas importantes são arquivadas? O foco é um excelente meio do cérebro saber se aquilo deve ser gravado. Se o foco no estudo durar 20 minutos, apenas, e depois entra-se em tédio e trabalho forçoso, é muito provável que o cérebro rejeite aquelas informações e o estudo terá menos resultados.

A prática fará com que o foco seja mantido por mais tempo. O importante é saber reconhecer quando a atenção dissipa, e, se perceber que não há jeito de retomar, fazer um intervalo.

Podemos perceber que o interesse presta duplo serviço. Além de ser um reforço para que aquilo seja gravado na memória, também aumenta o intervalo de concentração, que permite que tenha sessões de estudos mais longas e proveitosas.

O hábito moderno de checar o celular a cada 2 minutos impede que o aprendizado seja bem aproveitado. Organize o ambiente e revise seus hábitos para que o período de estudo seja feito sem interrupções. É preferível estudar apenas um pouco com total concentração do que três horas verificando o celular ou com a TV ligada. Se algum outro elemento esteja tirando seu foco, ajuste também!

Crianças costumam ter a atenção de apenas poucos minutos. Isso não quer dizer que não aprendam nada. Justamente o oposto! Quando elas percebem que não vão mais aprender nada com aquilo, mudam rapidamente para outra coisa. Por outro lado, em algumas atividades, as crianças parecem ficar entretidas por horas a fio. Interromper essa concentração profunda é um atentado ao aprendizado natural delas.

As escolas ou ignoram esse fato ou simplesmente perceberam que não há forma de resolver isso de forma adequada. Poucos modelos escolares permitem que a forma natural de aprendizagem de cada um seja respeitada da melhor forma. É preciso adequar a criança à escola e não é possível adequar a escola à criança, especialmente quando ficam maiores. Algumas famílias que optam pelo homeschooling deixam de considerar essa característica natural das crianças e acabam trazendo os rígidos horários da escola para suas casas, prejudicando desnecessariamente o aprendizado delas.

Na prática de instrumentos musicais, por exemplo, o mais adequado é fracionar o estudo em pequenas seções de poucos minutos. Repetir escalas musicais horas a fio mecanicamente é menos produtivo do que estudar apenas alguns minutos, mas com o foco adequado.

Realizar sessões de repouso estratégico pode potencializar os estudos

Comentei acima que o cérebro realiza o arquivamento das novas informações assim que entra em repouso. É uma das primeiras etapas dos ciclos do sono. É possível fazer sessões de estudo com breves repousos para aproveitar esse fato. Cada um deve descobrir o melhor para si, mas o que geralmente funciona em são sessões de estudo de 40 a 50 minutos com repousos de 15 a 20 minutos.

Esse repouso não significa que deve dormir, mas repousar como se fosse dormir. Isso potencializa os resultados dos estudos. Pode pensar nisso como uma breve sessão de meditação. Simplesmente fazer outra atividade totalmente diferente pode resolver. Alguns preferem trocar o assunto, mas continuar estudando.

Josh Kaufman recomenda que se estude o que considera mais fundamental em uma sessão logo antes de dormir. As informações serão recentes e o processo de arquivamento dará importância a esse fato.

Não é sempre que podemos simplesmente deitar e dormir, mas é recomendado, pelo menos, que se faça uma atividade totalmente diversa. Como se fosse um repouso que atletas fazem entre os períodos do jogo.

Se a sessão de estudos for muito intensa, é possível que, ao fecharmos os olhos, a mente fique repassando em velocidade altíssima tudo que estava fazendo. Isso significa que o processo está funcionando. Aguarde.

Esse processo consome muita energia mental e é fundamental que o corpo disponha de energia adequada para realizar o processo da melhor forma. Carros de corrida utilizam o melhor combustível disponível para melhor desempenho, devemos fornecer o melhor para nosso corpo funcionar plenamente.

Não basta simplesmente comer qualquer coisa. Alimentos que exigem muito trabalho para serem digeridos podem atrapalhar muito o processo mental. Estimulantes ou álcool podem prejudicar a qualidade do sono, e fazem com que o repouso seja incompleto. O resultado dos estudos ficam prejudicados.

O sono tem papel central no aprendizado, como podemos notar. Um elemento atribuído aos problemas de aprendizado e ansiedade das crianças de hoje em dia, além da televisão, é justamente as horas perdidas de sono. Po. Bronson e Ashley Merryman tratam desse tema em um capítulo do livro “Filhos — Novas ideias sobre educação”. As horas de sono a menos elevam o cortisol, hormônio do estresse, afetando até o hormônio do crescimento e a sensibilidade à insulina, dentre outras questões, como a falta de atenção e até obesidade.

Alimente-se corretamente e dê o melhor a seu cérebro

Manter-se em foco, raciocinar, ler, fazer atividades físicas e qualquer tipo de esforço físico ou mental consome muita energia. O processo mental que ocorre durante o sono também consome muita energia. Boa parte das calorias que consumimos diariamente é para manter o cérebro ativo, cerca de 20%, apesar de ter apenas 2% da massa corporal. Então, fornecer o combustível adequado ao cérebro é fundamental.

Essa área da ciência está passando por muitas revisões. Ideias como comer a cada 3 horas já foi desbancada, o jejum intermitente e dietas cetogênicas têm se mostrado excelente para inúmeras funções, com resultados consideráveis para o resultado mental. Os malefícios da gordura saturada já foram revisados e agora são até utilizados em altas doses para tratamento de alguns tipos de doenças neurodegenerativas. O “colesterol ruim” foi descoberto como sendo, na verdade, muito bom. Os pãezinhos e os cereais no café da manhã podem nos deixar letárgicos o dia todo, ao invés de dar energia como dizem os comerciais.

Isso coloca em xeque uma infinidade de hábitos e crenças que convivemos hoje em dia.

Quem não sente preguiça após o almoço? Será que é algo inevitável? Podemos simplesmente nos sentir enérgicos e produtivos o dia inteiro? Existe uma certa forma de se alimentar para ajudar o cérebro a formar novas conexões, melhorando as habilidades e nossa memória?

Depois de tantas novas descobertas, ainda é recebido com desprezo ideias de que a gema do ovo faz mal, de que a gordura animal faz mal por aumentar o colesterol e que as frutas podem fazer mal pelo excesso de açúcar.

Por muito tempo foi disseminado pelo mundo todo fatos incontestáveis de que o colesterol alto faz mal à saúde, mas não foi igualmente divulgado que o estudo que afirmou isso foi comprovadamente fraudado, e é, portanto, inválido. Da mesma forma, não foi amplamente divulgado que colesterol não causa problemas cardíacos. Sendo, na realidade, justamente o inverso, o que explica a perda cognitiva em consumidores de estatina (e, coerente a isso, melhores resultados cognitivos em pessoas de colesterol mais elevado).

É muito difícil desfazer uma mentira depois que ela já foi considerada como verdade por tanto tempo.

Alimentos para o cérebro

Um gene localizado no cromossomo 11 tem o código de produção da proteína BDNF (Fator neurotrófico derivado do cérebro), que tem papel fundamental na criação de novos neurônios e também na proteção dos neurônios existentes. Há relação dessa proteína com condições neurológicas, como epilepsia, anorexia nervosa, depressão, esquizofrenia e TOC.

Esse gene é ativado por uma série de hábitos pessoais, tais como atividades físicas, restrição calórica, dieta cetogênica e acréscimo de certos nutrientes, como a curcumina e o DHA (gordura ômega 3).

Atividades físicas são tão importantes e de eficácia comprovada de tal forma que é inadmissível que educadores ignorem isso e reduzam as aulas de educação física em prol de mais aulas de alfabetização. É preciso levar em conta a fisiologia dos alunos para montar grades de estudos. A noção de que mais estudo gera mais aprendizado ainda está enraizado nos burocratas e educadores que criam os programas educacionais.

Restrição calórica (cerca de 30%) pode aumentar a produção de BDNF e dar fortes melhoras na potência da memória de outras capacidades cognitivas. Se tiver uma prova, um concerto, uma apresentação ou simplesmente precisar o hábito de ter sessões de estudo altamente produtivas, deve-se levar isso em consideração. Longas sessões de digestão não são compatíveis com alto rendimento.

A curcumina (cúrcuma) é conhecida por suas propriedades anti-oxidantes, anti-inflamatórias, antifúngicas e antibacterianas, mas cientistas recentemente se interessaram pela capacidade da curcumina aumentar a BNDF. Comunidades em que o consumo de curcumina é frequente possuem índices baixos de demências e outras condições neurológicas.

DHA, o ácido docosaexaenoico, é uma gordura indispensável ao funcionamento do cérebro. Pelo menos 60% do peso do cérebro humano é composto gordura, e 25% disso é DHA. Ele funciona como um suporte para as membranas que envolvem as células cerebrais, sobretudo auxiliando as sinapses. Dentre as diversas funções, o DHA regula a expressão gênica que produz o BDNF. Em suma, o seu cérebro funcionará melhor se sua alimentação for rica em DHA.

Podemos fornecer DHA pelo consumo da gordura ômega 3 (não confunda com ômega 6), presente em inúmeros alimentos. É possível aumentar o DHA por suplementação, seja pelo conhecido óleo TCM (que alguns tomam com café e ghee, o bulletproof coffee), ou por óleo de krill (crustáceo semelhante ao camarão) ou de peixe. Por inúmeras razões, é pouco provável que se consiga a quantidade adequada de ômega 3 apenas pela alimentação comum.

Conhecer também os efeitos do glúten, mesmo para quem não é celíaco, pode ter efeito significativo na qualidade de vida e no desempenho mental. Há estudos que mostram a relação do consumo de glúten com a depressão, ansiedade e problemas de transtorno de humor. Conhecer os impactos disso pode ser muito relevante, especialmente para crianças que apresentam sintomas de TDAH, em especial o problema de foco e atenção.

Com o avanço da ciência genética, é inevitável que muitas crenças atuais sejam revistas, assim como alguns conhecimentos antigos sejam comprovados pela ciência e voltem a ser de conhecimento e prática comum.

Algumas verdades provavelmente demorarão mais para voltar ao conhecimento comum, pois vão de encontro aos interesses da indústria de alimentos e contra o establishment médico.

Existem livros que tratam do tema com maior amplitude e com muito mais detalhes. Veja no final do texto a bibliografia e pesquise mais, se quiser. Conhecer bem os benefícios dos alimentos pode potencializar nossa produtividade não só nos estudos, mas melhorar a disposição, saúde física e emocional e retardar o envelhecimento.

O resultado desse estudo é que provavelmente revisará uma série de alimentos que consome hoje pensando que são saudáveis, quando, na verdade só fazem bem à indústria de alimentos, que fatura com produtos milagrosos, que acabam por ser maléficos ao nosso organismo.

Nosso segundo cérebro

Estudos científicos têm revelado conhecimentos que a medicina oriental já pratica há muito tempo. A conexão intestino-cérebro não é apenas crendice. O intestino possui mais de meio bilhão de neurônios e mais de 300 trilhões de microrganismos vivos de 300 a 1000 espécies diferentes. O que antes era chamado de flora intestinal agora é chamado de microbioma. É praticamente um ecossistema inteiro.

Para se ter uma ideia das diversas influências no cérebro pelo intestino, sinais do intestino chegam à ínsula, ao sistema límbico, ao córtex pré-frontal, à amígdala, ao hipocampo e também ao córtex cingulado anterior. Em suma, esses sinais impactam a autoconsciência, as emoções, a moral, as sensações de medo, a memória e a motivação. Isso não quer dizer que ele determine tudo, mas certamente influenciam.

Tratamentos contra alergias tem sido feito com probióticos com excelentes resultados. A crescente depressão que vemos no mundo moderno pode ter muita relação com a mudança na alimentação. Uma saúde intestinal melhor pode melhorar sua vida em todos os aspectos, diferente do que muitos pensam.

Inúmeros testes com camundongos mostraram que é possível mudar o comportamento apenas transferindo bactérias intestinais de um para outro. Um camundongo pode se tornar mais corajoso ao receber bactérias de um camundongo mais corajoso, por exemplo. O mesmo acontece com propensão à obesidade e à depressão, também.

Quando comemos algo, não estamos só nos alimentando, mas fornecendo comida para todas essas bactérias vivas em nosso intestino. Ou seja, é preciso pensar nisso e planejar formas de equilibrar esse microbioma, de forma que nosso rendimento não seja prejudicado pela saúde do intestino.

Alimentos probióticos (com bactérias vivas) e pré-bióticos (que ajudam as bactérias boas) devem fazer parte da alimentação. Muitos alimentos vendidos como “saudáveis”, na verdade, alimentam as bactérias ruins e nos dão picos de glicemia. Já outros alimentos, comuns em outras culturas e épocas, eram até considerados remédios e hoje descobriu-se que realmente fazem muito bem. Sem a pretensão de ser exaustivo no tema, deixo na bibliografia alguns livros sobre o tema no fim do texto.

Mais uma vez, o cuidado com alimentação se mostra indispensável para o bom rendimento em sessões de estudo e para toda a qualidade de vida.

Yehudi Menuhin, grande violinista americano, sabia muito bem disso. Em sua obra “A lição do Mestre”, ele considerava fundamental o violinista ter preocupação com a alimentação, assim como com o corpo. Seu livro de conselhos inclui detalhes de sua dieta e até de suas sessões de yoga.

Estando tudo certo até aqui, o sucesso é garantido?

Infelizmente, não. Não basta ter o verdadeiro interesse, a motivação correta, o corpo e mente em pleno funcionamento e ajustar as sessões de estudo à capacidade do nosso foco e intercalar com repousos calculados.

Isso tudo ajuda, certamente, mas é preciso alguns elementos adicionais. Um deles é reconhecer que o aprendizado não funciona de forma linear e crescente. É preciso ter perseverança. É preciso estar habituado a se sentir desafiado e superar frustrações.

Um aprendiz empaca em certos estágios e pode parecer que não está evoluindo ou mesmo desaprendendo, por vários meses. Parece realmente um teste à nossa vontade e à nossa paciência. Às vezes parece que simplesmente não fomos feitos para aquilo (se você possui filhos pequenos e está pensando em seu papel como pai e mãe, leia meu outro texto “Como treinar seu filho para ser bem-sucedido”, link no final).

Novamente, é preciso considerar como o cérebro forma as habilidades e as memórias.

Em outro texto meu, expliquei brevemente os conceitos de incubação e percolação, que podem também explicar essa sensação de “empacar” nos estudos. De forma simples, voltando à analogia das fichas, cada nova ideia vista no dia, e cada nova habilidade é registrada em uma ficha que deve ser arquivada no local adequado, durante o sono, para que depois aquela habilidade e aquelas memórias sejam de fácil acesso. Vamos acrescentando novas fichas diariamente e imaginamos que isso dê resultados rápidos e observáveis a cada dia. Esperamos melhorar um pouco todos os dias.

A verdade é que muitas fichas podem ficar separadas aguardando o local mais adequado para serem arquivadas, ou mesmo fichas que já estavam arquivadas podem ser retiradas de seus locais para encontrarem um local melhor. Após o processo de percolação (filtragem das ideias que devem ficar guardadas ou descartadas), há o período de incubação, onde as ideias são reavaliadas e começam a se conectar melhor com outras. Durante essa reorganização, a sensação pode ser de confusão ou de esquecimento. Em crianças, notamos elas esquecendo coisas que sabiam com certeza absoluta e esquecendo coisas que viram no dia anterior. É normal e desejável, até.

Da mesma forma que temos essas sensações de esquecimento, eventualmente teremos a sensação inversa, a sensação de uma súbita evolução. Os conceitos que antes eram confusos agora parecem óbvios e fáceis. Aquela passagem no piano, de repente, ficou simples, aquela prova de matemática, agora parece fácil ou alguns termos complexos, agora parecem fazer parte do vocabulário corrente.

Algumas habilidades foram reorganizadas de tal forma que parecem até automáticas. Você nem sequer precisa mais pensar a respeito. Quem dirige há muitos anos têm essa sensação quando chega de um local a outro sem sequer se dar conta da complexa coordenação de embreagem, volante, marcha, espelhos, semáforos e atenção aos carros ao redor. Isso não quer dizer que as informações não sejam calculadas pelo cérebro, mas foram transferidas para uma região onde funciona de forma mais automática.

Muitas das nossas funções cognitivas funcionam exatamente dessa forma. Coisas que inicialmente exigem muito esforço, passam a ser automáticas depois. Não precisamos mais pensar pra caminhar ou para comer. Esse processo faz parte do desenvolvimento de, praticamente, qualquer conhecimento e qualquer habilidade motora.

Para esse processo funcionar bem, é preciso que todo estudo seja feito de forma lenta e consciente. Um violinista se prepara estudando tudo de forma lenta e separando cada habilidade a ser adquirida em blocos menores. Quanto mais lenta e conscientemente for feito o estudo, mais fácil será para o cérebro reorganizar aquilo depois e tornar “automático”. Quando seu professor de música falar que deve estudar lentamente, sabendo ele ou não, isso possui embasamento científico. Estudar rápido demais pode ser até pior para o aprendizado, pois, muita coisa será aprendida de forma errada.

Ou seja, não é necessário ter pressa em generalizar o conhecimento ou em adquirir a fluidez e intuição que se observa nos mais experientes, a melhor forma de os desenvolver é pelo estudo lento e concentrado. Um pianista habilidoso não toca peças complexas apenas pelo talento, mas por muitas horas de estudo lento e consciente.

O estudo de partes menores de algum assunto são progressivamente analisados pelo cérebro e conjugados em um só conhecimento geral posteriormente. O violinista pode muito bem separar uma peça complexa em inúmeros estudos menores e específicos, identificar os trechos difíceis e transformar uma peça em centenas de pequenos estudos; o cérebro se encarregará de conjugar tudo isso e a peça pode ser executada posteriormente com naturalidade. O mesmo acontece com qualquer área de conhecimento.

Se o estudo for feito de forma apressada e sem a devida atenção, a mente não será capaz de evoluir adequadamente, pois não está claro ainda como cada detalhe deve ser tratado.

Robert Greene descreve isso em um dos capítulos finais, onde explica as raízes da intuição de um mestre. Como exemplo, fala da lenda do xadrez Bobby Fisher, que estudou cuidadosamente e internalizou lentamente uma quantidade incrível de padrões das peças. Com plena atenção, todo esse estudo foi lentamente combinado até uma compreensão completa do jogo. Era capaz de ganhar de outros grandes mestres sem que esses se dessem conta do que estava acontecendo.

É preciso ter muita paciência nessas horas e ser perseverante. Saber que é um processo mental natural certamente ajudará nisso.

Encontrar um bom professor, que lhe sirva de mestre

Professores não faltam, já os verdadeiros mestres, são poucos. Professores transmitem conteúdo, enquanto o mestre ensina mesmo quando não está diretamente transmitindo conteúdo — eles educam pelo modo de ser e é possível aprender com eles apenas os observando.

Gusdorf, em sua excepcional obra “Professores, para quê?”, analisa isso com muita profundidade. O papel do mestre supera em muito o papel do professor.

Alguns elementos podem ajudar a compreender essa diferença.

Professores que muito apegados à própria imagem e ao próprio prestígio podem deixar o aluno em segundo plano. Essa vaidade pode fazer com que deixem de observar as necessidades de seus alunos, tornando a autoafirmação como tema central do ensino.

Nas palavras de Gusdorf:

“O melhor mestre não é o que se impõe, o que se afirma como dominador do espaço mental, mas, muito pelo contrário, o que se torna aluno do seu aluno. […] Sócrates, que se apaga diante de seu aluno, não é menos mestre do aquele que se impõe e reina sobre fáceis prestígios”.

Pelas palavras de Hugo de São Vítor, há o ensino centrado no professor e o ensino centrado no aluno. No primeiro caso, há uma “transferência mecânica de conhecimento do professor para o aluno; o segundo, centrado no aluno, tende a tornar-se uma aventura do espírito”, e acrescenta que o ensino centrado no professor só produzirá um aluno melhor que seu professor por acaso, quando o aluno fugir espontaneamente dessa pedagogia. O ensino centrado no aluno tende a produzir alunos melhores que seus professores.

Gusdorf, ainda diz que “o principal do ensino é algo que não se ensina, mas que é dado em acréscimo ao que se ensina” e, também afirma que o contato com um mestre é bom independente do que é ensinado. Em outro trecho, diz que “o ponto central não consiste na aprendizagem de muitas coisas, mas no autoconhecimento e no autodomínio que conduzem à plena e humana realização, seja qual for o campo particular de exercício que se escolheu.

Falsos mestres, inclusive, se fecharão quando o aluno demonstrar interesse pelos ensinamentos de outro professor. Demonstrarão inveja e farão o possível para não perder seu pupilo, ou simplesmente se voltarão contra ele e tratá-lo-ão como uma espécie de traidor. Enquanto isso, o verdadeiro mestre anseia que seu aluno o supere, e não pensa duas vezes em encaminhá-lo a outro mestre quando considerar adequado. Sobre isso, Gusdorf ainda fala que “o mestre, já adiantado no seu próprio caminho, conhece os seus limites; todo o homem digno deste nome (de mestre) não pode dissimular a si mesmo as suas insuficiências”.

E, por fim,

“para além de todas as lições ensinadas e aprendidas, o melhor ensino que o mestre pode dar é o ensino da própria qualidade de mestre (…). O verdadeiro mestre reconhece-se a si próprio como servidor e discípulo da verdade; convida os seus alunos a procurá-la pelo seu lado e segundo os seus próprios meios”.

Esse tema sempre me interessou muito e ainda teria muito a acrescentar aqui, mas creio já ter excedido o tamanho que costuma reter a atenção pela Internet. Se tiver algum comentário, sugestão ou crítica, deixem nos comentários!

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